quinta-feira, junho 27

Fabulista clássico com um toque minimalista

"Vida, e vida presa, e apenas por um fio, é coisa que toda a gente tem. Embora nem toda a gente saiba que tem, ou dê por isso. Nem toda a gente está cá para o efeito. Dar por isso não deixa de ser, não obstante, a melhor das razões para cá se estar. E não há assim tantas." (Um Fio Que Te Prende À Vida, p.5). 


E foi do que sempre tratou Rui Caeiro (Vila Viçosa, 27 de Junho de 1943 - Oeiras, 29 de Janeiro de 2019): dessa consciência de transitoriedade e de precariedade. 

Na sua escrita "não poetiza os lugares, nem congela o poema numa cartografia estreita. Os espaços têm, pelo contrário, o dom da necessidade, como se emanassem de qualquer destino que os implicasse, como uma artéria no corpo, na constituição da própria escrita" (Hugo Pinto Santos).  O poeta "não só não tinha como desprezava os enlevos por ´beldades mortas e pianos tuberculosos´. Mas apreciava as "eternas dúvidas", essas inquietações que lançam um pano sobre o espírito, lhe denunciam as formas, e nos tornam sujeitos em comum, implorando do caos a clemência de um sentido qualquer, por mais mísero que seja" (Diogo Vaz Pinto). Talvez em melhor síntese, "Rui Caeiro age como um fabulista clássico com um toque minimalista" (José Ángel Cilleruelo). Ao longo de trinta anos de publicação, fez do seu modo de ser discreto e sóbrio uma prática literária, oferecendo a parte maior da sua obra em edições de autor ou em editoras independentes. Tradutor e poeta, estreou-se tardiamente (Deus, sobre o magno problema da existência de Deus, 1988). Nunca teve prémios. "Alguns há para quem as despedidas podem ser ao mesmo tempo banais, sem história e difíceis ainda assim", anotou Rui Caeiro, no seu Acabamentos de primeira (Edições Eclusa).


No seu derradeiro livro, um duplo, Diálogos Marados / Um Maluco Vem Pousar-me na Mão, da Livraria Snob, deixou-nos um "best-of" de coisas ouvidas, anedotas; uma espécie de balanço. 

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