Observa Eduardo Lourenço: “A cem anos da sua voluntária morte, Antero ainda tem inimigos. E merece tê-los. O horror seria que os não tivesse. (…) A visão unanimista da Geração de 70 que tem nele o seu ícone cultural esconde mal os conflitos, os antagonismos, as rivalidades, surdas ou clamadas, que, com matéria viva, o atravessaram.” Antero deixou uma obra que “é a estrela negra, fascinadora e repulsiva. (...) A configuração trágica da obra e da vida de Antero — a primeira entre nós que assumiu esse perfil — é odiosa a gregos e troianos”.
É certo que teve maior impacto o discurso de Antero nas Conferências do Casino (1871), “Causas da Decadência dos Povos Peninsulares”, estabelecendo, pela primeira vez, “um ajuste de contas da nossa cultura com ela mesma”, proibidas pelo Governo e encerradas pela polícia, mas Eduardo Lourenço não tem dúvidas: Antero é “a maior referência intelectual portuguesa”, “o primeiro português que teve uma consciência trágica do destino humano” e quem marcou o início da nossa modernidade com Odes Modernas, abrindo caminho ao imaginário de Cesário Verde, de Camilo Pessanha e de Fernando Pessoa.
Nestes ensaios, Eduardo Lourenço apresenta-nos uma visão da problemática anteriana do “prosador e do poeta de génio” e outro aprofundamento do homem múltiplo e trágico. E não será preciso lembrar que Vitorino Nemésio, mal saiu a Heterodoxia, livro de estreia de Eduardo Lourenço, em 1949, alertou para “um nervo e uma elegância que farão a inveja de muitos prosadores”.
ANTERO, PORTUGAL COMO TRAGÉDIA
de Eduardo Lourenço
edição: Fundação Calouste Gulbenkian, 2019

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