sábado, setembro 21

Os debates políticos na televisão ainda fazem a diferença?


"SIM. O eleitor português médio deste regime político foi geneticamente educado por uma democracia de conversa televisiva, ao ritmo do chamado talk show, com moderadores marcados pelo estilo “Zip-Zip”. Descobriu, pela experimentação, que as eleições, parlamentares e presidenciais, não servem apenas para que surjam representantes formais, legitimados para agir em nome do povo. Sentiu que precisava também de uma representação inteira, através de líderes que partilhassem características comuns ou similares às dos representados, e até de quem simbolizasse ideias que tivessem que ver com o estado de mente dos representados. Neste sentido, a televisão, com a conversa e o debate, é bem mais importante do que a campanha do “porco no espeto”, das visitas de soberania e do comício, com muita música pimba e folhetos, tudo intermediado pelos aparelhos partidários. “A televisão ainda é uma dessas caixinhas mágicas que permite um olhar mais inteiro nos líderes” O inequívoco êxito dos debates televisivos, principalmente dos bilaterais, demonstrou que os programas de informação política, dominados pelo “agenda setting” dos aparelhos comunicacionais, tinham enevoado a realidade das ofertas eleitorais, personificadas em cada um dos líderes dos seis partidos com assento parlamentar. Porque o homem comum prefere ver o jogo ao vivo e em direto, para decidir pela razão e pela emoção, sem a floresta dos comentadores, plenos de preconceitos e fantasmas. Teme, sobretudo, que possa emergir o drama de uma democracia sem povo e quer mesmo mandar alguma coisa. O mesmo homem comum começa a exigir uma representação substancial e não apenas meramente formalista, descritiva ou simbólica. Por outras palavras, para se evitar o populismo, o líder político deve ser permanentemente medido na sua autenticidade. O homem comum anseia por aquela quotidiana prestação de contas que possa estabelecer a distância entre aquilo que o representante diz ser e aquilo que o representante efetivamente faz. A televisão ainda é uma dessas caixinhas mágicas que permite, embora imperfeitamente, um olhar mais inteiro nos líderes, para que possa ter confiança em qualquer um deles. Porque votar é estender a mão a esse representante para se selar o negócio com a segurança íntima. Trata-se, afinal, de entregar, ao representante, o poder de administrar alguma coisa que é de todos. Porque, em democracia, só há autoridade que venha dessa confiança, para que, depois, ela possa ser desenvolvida através do prestígio do representante. A democracia pode voltar a ser conversa, e será melhor. "

ADELINO MALTEZ, Professor e politólogo

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