segunda-feira, maio 8

Paulo Tunhas (1960-2023)


1960-2023 Paulo Tunhas, um dos poucos intelectuais públicos em Portugal, morreu cedo e deixa um vazio enorme naqueles que por causa dele compreendiam tudo melhor.
"Os amigos coincidem em palavras que usam para o descrever: afável, “sereno”, “irónico”, “erudito”, “elegante”, “livre”. Coincidem de novo quando o descrevem como um grande conversador, alguém que gostava da vida e com quem era um prazer falar. A liberdade profunda de Paulo Tunhas era evidente para quem seguia as suas crónicas há nove anos no “Observador”, onde exibia uma erudição não exibicionista. Não estava ali para mostrar que sabia — e estava na plenitude da sua vida intelectual —, mas para tornar claro o que era complexo, difícil, pouco lido ou estudado, pouco conhecido, descrevendo com humor o quotidiano político cheio de dramatismos e aparentes subtilezas. Era um professor acarinhado pelos alunos, que falam sobre a sua clareza como uma virtude — e bem. Nos dias onde vivia, era um professor pouco professoral, quase mais um aluno melhor do que os outros que se dedicava por generosidade, curiosidade e por lhe dar genuína felicidade a explicar o que era difícil, como o pensamento de Kant ou as virtudes aristotélicas. Num dos seus últimos projetos, e tinha muitos ainda por realizar, participava num ciclo de debates com o historiador Rui Ramos sobre “valores”, em que se falava sobre temas como a “coragem” ou a “empatia”. Embora as conversas entre o historiador e o filósofo estejam disponíveis em formato podcast, o público podia assistir ao vivo a conversas sobre temas que se repetem, como tão bem assinala o título de uma breve história da filosofia que escreveu com Alexandra Abranches. É nessas alturas que gostamos de o ver a falar e a pensar ao mesmo tempo, com dúvidas e pontas soltas. Segundo Sérgio Sousa Pinto, Paulo Tunhas era “muitíssimo bem-educado, por isso nunca falava dele”. Era mais curioso sobre os outros e não hesitava em contactá-los quando tinha interesse. Escrevia um e-mail, combinava um almoço, porque se ria com o que a outra pessoa escrevia ou queria saber mais sobre a outra pessoa. Escreveu a Edgar P. Jacobs, autor da série de livros de banda desenhada “Blake and Mortimer”, e recebeu resposta. Era fã da soprano francesa Patricia Petibon e não hesitou em escrever-lhe e em conhecê-la. Não tinha medo dos que não conhecia. A sua educação não o permitia. Paulo Tunhas nasceu no Porto em 1960. Licenciou-se em Filosofia na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Deu aulas no ensino secundário durante pouco tempo. Partiu para Paris, onde concluiu o doutoramento com o filósofo Fernando Gil, seu mestre intelectual, na École des Hautes Études en Scien­ces Socia­les. Passou por Londres, onde viveu pouco tempo, e também pelo Brasil, até que regressou a Portugal e começou a ensinar na Universidade Fernando Pessoa. Em 2008 começa a dar aulas na FLUP, onde era atualmente professor no Departamento de Filosofia. Era também investigador principal do Instituto de Filosofia da Universidade do Porto. Escreveu vários livros, inúmeros artigos científicos, centenas de crónicas na imprensa. Deixa muitos leitores, muitos amigos, muitos alunos, muitas pessoas que percebem o que significa esta perda."
CARLA QUEVEDO, Expresso

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