Publicada em 1902, A Carta de Lord Chandos, do vienense Hugo von Hofmannstahl (1874-1929) é um texto programático, uma “disfunção historicamente determinada”, escreve João Barrento, num excelente posfácio que acentua os antecedentes antigos e as afinidades contemporâneas do texto, do “Crátilo” de Platão aos autores de língua alemã como Nietzsche, Freud, Wiittgenstein ou Kraus. Aqui, o sismógrafo é o de um desencanto com a linguagem e um mal-estar civilizacional. Uma tentação niilista, a que Barrento acrescentou as também ficcionais “Cartas do Regresso” (1907-08), em que um negociante cosmopolita de meia-idade volta à Alemanha após longa ausência e tudo lhe parece desconjuntado, arbitrário, falso. Antes, temos um Philip Chandos, que até Agosto de 1603, tudo o que fazia ou escrevia possuía uma unidade e um entusiasmo. Algo que se vai perder num “estado inexplicável” que ora pode ser depressão, ora uma doença de espírito. O leitor, conforme o for, escolherá.
CARTAS PARA ESTE TEMPO, de Hugo von Hofmannsthal
BCF Editores, 2020, trad. e ensaio de João Barrento, 114 págs., €12
Sem comentários:
Enviar um comentário