sexta-feira, março 10

Irei Cuspir-vos nos Túmulos


Sobre Boris Vian (Ville-d'Avray, 10 de Março de 1920 — Paris, 23 de Junho de 1959) há muito a dizer. O que se poupou em vida, custamo-lo agora. Foi engenheiro, escritor, poeta, tradutor e cantar/compositor francês. Ficou identificado com o movimento surrealista e ao anarquismo enquanto filosofia política. Inventava palavras e enredos passados sempre num universo muito próprio. É por isso que Outono em Pequim não se passa nem no outono nem em Pequim. Foi também um membro muito influente no Jazz francês e o responsável pelo lançamento de vários interpretes da canção Francesa, nomeadamente Serge Reggiani, Juliette Gréco e grande influência para Gainsbourg. Boris Vian trabalhou muito nos 39 anos que viveu. Sucumbiria, a caminho do hospital, a um ataque cardíaco que sofrera no cinema Le Marboeuf, em Paris, enquanto via, exasperado, a adaptação cinematográfica feita a partir do seu livro J'irai cracher sur vos tombes, editado entre nós pela Relógio d’Água com o nome Irei Cuspir-vos nos Túmulos.

+

♫ ♫ Boris Vian canta “Le Déserteur", com música de Harold B Berg e letra sua, que aqui deixo no original e na versão que José Mário Branco cantava.♫ ♫

LE DESERTEUR

Monsieur le Président
Je vous fais une lettre
Que vous lirez peut-être
Si vous avez le temps
Je viens de recevoir
Mes papiers militaires
Pour partir à la guerre
Avant mercredi soir
Monsieur le Président
Je ne veux pas la faire
Je ne suis pas sur terre
Pour tuer des pauvres gens
C'est pas pour vous fâcher
Il faut que je vous dise
Ma décision est prise
Je m'en vais déserter

Depuis que je suis né
J'ai vu mourir mon père
J'ai vu partir mes frères
Et pleurer mes enfants
Ma mère a tant souffert
Elle est dedans sa tombe
Et se moque des bombes
Et se moque des vers
Quand j'étais prisonnier
On m'a volé ma femme
On m'a volé mon âme
Et tout mon cher passé
Demain de bon matin
Je fermerai ma porte
Au nez des années mortes
J'irai sur les chemins

Je mendierai ma vie
Sur les routes de France
De Bretagne en Provence
Et je dirai aux gens:
Refusez d'obéir
Refusez de la faire
N'allez pas à la guerre
Refusez de partir
S'il faut donner son sang
Allez donner le vôtre
Vous êtes bon apôtre
Monsieur le Président
Si vous me poursuivez
Prévenez vos gendarmes
Que je n'aurai pas d'armes
Et qu'ils pourront tirer


O DESERTOR

Ao senhor presidente
e chefe da nação
escrevo a presente
pra sua informação

recebi um postal
um papel militar
com ordem pra marchar
prà guerra colonial

diga aos seus generais
que eu não faço essa guerra
porque eu não vim à Terra
pra matar meus iguais

e aqui digo ao senhor
queira o senhor ou não
tomei a decisão
de ser um desertor

desde que me conheço
já vi meu pai morrer
vi meus irmãos sofrer
vi meus filhos sem berço

minha mãe sofreu tanto
que me deixou sozinho
morreu devagarinho
nas dobras do seu pranto

já estive na prisão
sem razão me prenderam
sem razão me bateram
como se fosse um cão

amanhã de madrugada
pego numa sacola
e na minha viola
e meto-me à estrada

irei sem descansar
pela terra lusitana
do Minho ao Guadiana
toda a gente avisar

à guerra dizei 'não!'
a gente negra sofre
e como nós é pobre
somos todos irmãos

e se quer continuar
a matar essa gente
vá o senhor presidente
tomar o meu lugar

se me mandar buscar
previna a sua guarda
que eu tenho uma espingarda
e que eu sei atirar

Sem comentários:

Enviar um comentário