quarta-feira, janeiro 18

A origem da couve



Rubén Darío (Nicarágua, 18 de Janeiro de 1867 – 6 de Fevereiro de 1916), de seu nome Félix Rubén García Sarmiento, foi, além de jornalista e diplomata nicaraguense, um extraordinário escritor. É por isso que se deve acreditar na lenda de que este “bravo libertador da América” já lia aos 3 anos. Já no que ele diz ser o modernismo - “não é outra coisa que o verso e a prosa castelhanos passados pelo fino crivo do bom verso e da boa prosa francesas” - deixo isso às couves.
"No paraíso terrestre, no luminoso dia em que as flores foram criadas, antes que Eva fosse tentada pela serpente, o maligno espírito aproximou-se da mais bela rosa, no momento em que esta estendia, à carícia do celeste sol, a encarnada virgindade dos seus lábios.
– És bela.
– Sou – disse a rosa.
– Bela e feliz – prosseguiu o diabo. – Tens a cor, a graça e o aroma. Mas…
– Mas?
– Não és útil. Não vês estas vastas árvores carregadas de bolotas? Além de frondosas, dão alimento a multidões de seres animados, que se detêm sob os seus ramos. Rosa, ser bela é pouco…
A rosa – tentada, como seria depois a mulher – desejou então a utilidade, de tal modo que houve palidez na sua púrpura.
Passou o bom Deus, depois do romper da aurora.
– Pai – disse aquela princesa floral, agitando-se na sua perfumada beleza – quereis fazer-me útil?
– Seja, minha filha – respondeu o Senhor, sorrindo.
E o mundo viu então a primeira couve."
Rubén Darío, Curiosidades Literárias e Outros Contos, "A ORIGEM DA COUVE"Colecção Avesso, editora Exclamação, março 2018, p. 73

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