
Com ensaios de resultados reconhecidos, "se o reconhecimento da qualidade e influência dos seus estudos era consensual nos círculos académicos, Mourão nunca foi propriamente um ensaísta em voga, desses que são convidados para tudo e mais alguma coisa, porque nunca esteve para aí virado".
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Depoimento de Gonçalo M. Tavares para o jornal i:
"Luís Mourão tem um percurso académico e intelectual muito forte e escreveu de uma forma invulgarmente lúcida sobre alguns dos autores que seguia atentamente.
Sinto-me muito honrado por ser um deles e por ter sido acompanhado e seguido, crítica e intelectualmente, pelo Luís Mourão, quase desde o início.
Outras pessoas estarão bem mais habilitadas para falar do seu notável percurso académico e intelectual. Neste depoimento, tentarei falar das vezes em que nos cruzámos, e em que situações.
Ele foi, por exemplo, uma das pessoas que leu o Aprender a Rezar na Era da Técnica antes de ser editado e também o Viagem à Índia. Conversámos sobre esses livros antes de eles existirem cá fora.
Nas primeiras páginas de Aprender a Rezar na Era da Técnica, fiz questão de agradecer expressamente a sua generosidade.
Luís Mourão foi também autor de alguns dos ensaios mais esclarecedores e profundos sobre a minha obra. Na retaguarda académica, com tempo, ele escreveu e publicou inúmeros textos sobre O Reino, por exemplo, que são de uma argúcia notável.
Só muito tarde soube da doença do Luís Mourão.
Já depois de saber da doença estive com ele por diversas vezes. O Luís esteve presente, para minha surpresa, recentemente, em diferentes cidades, nas apresentações de uma performance que fiz, e no final falámos sempre de uma maneira tão simples e forte que pensar nisso me comove.
A última vez que falámos foi na biblioteca de Braga, a propósito de um curso, há cerca de um mês, e ele disse-me, com entusiasmo, que estava a reunir e organizar os vários textos que tinha escrito sobre a minha obra para editar em livro.
Quando nos despedimos nesse dia, quando o Luís estava já de saída com o apoio carinhoso e delicado de uma amiga querida, acelerei um bocado o passo, acelerei muito o passo, para me despedir dele. Felizmente consegui despedir-me e agradecer, naquele momento, toda a atenção, toda a generosidade que ele estava, com a sua presença, a oferecer-me, é essa a palavra.
A notícia da morte dele entristeceu-me muito e é difícil falar sobre isso ainda. Era um homem tranquilo, muito inteligente e ponderado.
Sou um animal de memória firme em relação às pessoas generosas que me deram e dão muita energia intelectual para continuar. Uns que já desapareceram - Eduardo Prado Coelho, José Saramago, Vasco Graça Moura, etc.; outros, muitos, que felizmente ainda estão vivos.
O Luís Mourão, com os seus textos e não só, ofereceu-me sempre uma energia forte para continuar.
O Luís deu-me muito mais do que eu lhe dei. Estou-lhe muito grato. É meu dever tentar retribuir."
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