quarta-feira, janeiro 26

A Devida Comédia


"Em primeiro lugar, a confusão evidente à volta do princípio do juiz natural e da aleatoriedade na distribuição de processos.
 
Uma coisa é uma distribuição intencionalmente desviada, para atribuir um processo a um juiz específico e influenciar o sentido da decisão; outra, muito diferente, é uma distribuição irregular, resultante da violação das formalidades legais, sem intenção desviada, por erro, negligência, facilitismo ou seja lá o que for. Uma e outra têm motivações e consequências distintas e misturar tudo na mesma narrativa não é sério. 
Em segundo lugar, a tese da perseguição política pelos agentes da justiça é delirante. 
Pergunto eu: perseguição política porquê? Fui secretário-geral da associação dos juízes entre Abril de 2006 e Abril de 2011 e apanhei os dois governos de Sócrates. Tive duas reuniões com Sócrates e dezenas com os seus ministros e secretários de Estado da justiça e com o grupo parlamentar do PS. Houve matérias de discordância séria, como a tentativa de “funcionalização” das magistraturas, chumbada pelo Tribunal Constitucional em 2007; mas também houve reformas estruturais muito importantes, como a revisão do mapa judiciário e da gestão e organização dos tribunais, que foram aprovadas em 2008 com uma ampla colaboração e aceitação dos juízes. A relação entre os juízes e os governos de Sócrates teve altos e baixos, como tinha tido com governos anteriores e teve com os que se seguiram. Nada de extraordinário que sustente a narrativa vitimizadora do ódio coletivo. 
Em terceiro lugar, o vício de raciocínio mais óbvio. 
Vamos lá admitir, a bem do argumento, que o processo foi parar criminosamente ao juiz Carlos Alexandre para ele perseguir o ex-primeiro ministro. Então e os muitos recursos das suas decisões que foram depois confirmadas em momentos diferentes por vários juízes desembargadores da Relação de Lisboa? Será que estavam todos metidos na mesma “manigância”? Fecharam todos os olhos às decisões parciais do juiz Carlos Alexandre? Isto é por demais absurdo."

Sem comentários:

Enviar um comentário