terça-feira, outubro 5

A Devida Comédia (anual)

 

"Nós e as Repúblicas Bálticas. Entre 1995 e 2020 (Os dados têm por fontes a OCDE e a base AMECO):

 

1)    o rendimento per capita português elevou-se de 47,9% da média da UE15 para 56,9%; no mesmo período, nas Repúblicas Bálticas passou de valores entre os 7,5% e os 11% para níveis entre os 45% e os 59%;

 

2)    o nível médio de salários (em dólares), em percentagem do praticado em Portugal, subiu de 40% na Letónia, 42% na Estónia e 43% na Lituânia para, respectivamente, 108%, 105% e 112%; a remuneração real dos trabalhadores cresceu em média 0,7% por ano em Portugal, contra variações entre os 4,2% e os 5,5% nesses países;

 

3)    o rácio da dívida pública era, em Portugal, de 121% do PIB em 2018 (antes da pandemia), ano em que, nas Repúblicas Bálticas, variava entre os 8% e os 37%; em 2020 estes valores subiram para 134% em Portugal e entre 18% e 47% nas Repúblicas Bálticas;


4)   em 2020, a carga fiscal corrente (que exclui impostos sobre o património) atingiu em Portugal 37,1%, contra 34,5% na Estónia, 32,1% na Letónia e 31,7% na Lituânia.


As Repúblicas Bálticas, com quebras do PIB (a preços constantes) que variaram entre os 12% e os 18% em 2009/10, foram os países da UE mais duramente afectados pela crise financeira, mas a solidez da posição orçamental permitiu que os défices subsequentes não afectassem a sua credibilidade financeira e dessem lugar a uma rápida recuperação.

 

A evidência destes dados mostra como a oposição entre a política orçamental e as políticas estruturais foi, ao longo de todo este período, o ponto fraco da política económica portuguesa, que entendeu a adesão à moeda única como fonte inesgotável de financiamento, enquanto ignorou as suas implicações estruturais, em particular em matéria de competitividade. 

 

A sua prioridade absoluta deveria consistir em pôr termo ao recurso a “bazucas” como forma de manter o status quo sob a aparência de o alterar. Dessa opção, e não das ilusões em que a política orçamental há muito se especializou, depende a capacidade de estimular o investimento necessário ao crescimento da economia e à sustentação do Estado social que todos defendem.

 

É óbvio que um orçamento anual não pode por si só resolver estes problemas. Mas nada desculpa que continuemos a adiar o reconhecimento da sua existência e do ruinoso contributo para o seu agravamento que resulta do modo como encaramos a política orçamental."

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