"E é certamente esta atomização*, enquanto factor que juntamente com outros ainda mais pesados fecha o espaço público e de recepção crítica, que limitou a irradiação de um livro que se elava acima da paisagem, chamado Clavicórdio (Língua Morta), publicado no ano passado. A autora deste livro é Andreia C. Faria, uma poeta que desta vez fez uma incursão pela prosa, por pequenos textos em prosa que têm a força de um recomeço de qualquer coisa que parecia ter desaparecido: o recomeço de uma escrita que tem a capacidade de criar um mundo complexo e prodigioso, completamente contrário à universal “reportagem”, a partir de coisas poucas e pequenas; a apoteose de um espaço literário que produz estranheza e loucura (como, de outra maneira, o dos contos de Herberto Helder), a partir de matéria lisa e banal. Tudo aqui surge cruelmente desfigurado pela violência da escrita."
António Guerreiro, Público
* "subdivisão do espaço sob a forma de um arquipélago formado por muitas ilhas. A proliferação de pequenas editoras, criadas geralmente ad hoc, proporciona alguma diversidade, garante o acesso à publicação e contraria de maneira saudável o processo de classicização e canonização a que aspiram as grandes editoras. Mas também tem alguns efeitos nefastos que se têm acentuado: cria territórios protegidos e círculos relativamente fechados que desenvolvem a lógica da auto-complacência e da legitimação que se satisfaz no interior do grupo. O nosso espaço público literário é hoje muito mais um multiversum do que um universo. Uma forte identificação dos autores com as marcas editoriais provoca fechamentos e engendra preconceitos."
Sem comentários:
Enviar um comentário